Autoridade que não pondera...

08-12-2013 00:03

Foram divulgados por alguns órgãos de comunicação social dados preliminares de um inquérito aos fogos do verão pretérito solicitado pelo Governo, segundo os quais os bombeiros negligenciaram a forma de atuação, ao violarem regras de segurança, em sete dos oito casos mortais nos incêndios preditos. Tais dados apontam assim, como causa da perda de tais vidas, falha humana explicitada: em erros de manobra, mau posicionamento no terreno e ainda erros na abordagem aos sinistros.

Por seu turno, a Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC) considerou hoje ser "especulativo e despropositado imputar qualquer tipo de responsabilidades" aos próprios bombeiros.

Parece-me de mau tom e de efeito perverso tentar apontar inequivocamente como causa do morticínio referenciado qualquer espécie de falha humana. O combate ao incêndio florestal não é um jogo de futebol ou uma operação de guerra clássica em que as posições são previamente delineadas ou em que se possam prever cenários a opor a prováveis falhas de planeamento ou surpresas da parte do inimigo. Dada a complexidade do combate aos fogos florestais, a multiplicidade de frentes, a falta de prevenção eficaz e a extenuação dos operadores no terreno, torna-se injusto atribuir levianamente a desgraça a causas endógenas ao corpo de combate. É que se trata mais de uma espécie de guerrilha espetacularmente oferecida pela natureza, mas quase sempre servida por guerrilheiros humanos habitual e habilmente bem ocultos.

Tais asserções das autoridades podem ter algum fundo de verdade, mas inserem-se sobretudo no propósito oculto ou confesso de descrédito a que os governantes dos últimos tempos têm votado os operadores no quadro da coisa pública, sejam eles professores, polícias, trabalhadores da administração e sejam, agora, os bombeiros. A ideia parece ser a crucifixão dos mais qualificados academicamente e/ou experiencialmente.

Porque não apontar falhas graves de coordenação, não imputáveis obviamente aos generosos soldados da paz? Especifico: os comandantes no terreno são sempre pessoas da área geográfica com conhecimento da orografia e do regime de ventos? São sempre agentes conhecedores do terreno e dos bombeiros, pessoas qualificadas pelos estudos específicos e pela experiência ou são impostos por gente ligada ao poder económico ou ao poder político, como que caindo no terreno de paraquedas? Os comandantes no terreno dispõem de autonomia para tomar as decisões mais congruentes ou têm de se sujeitar ao poder autárquico ou ao poder central, quiçá sob a égide de iníquo negócio à custa da terra queimada, da extenuação de tantos e do vergonhoso espetáculo de verão cada mais a entrar pelo ano todo?

Deixemo-nos de tretas. Tratem da prevenção e entreguem o comando do combate a quem saiba!