E se não tivesse sido implantada a República...

14-12-2013 23:10

Venho lendo um livro A República nunca existiu - uma antologia de contos sobre um Portugal onde o regicídio falhou. Todos os contos (há também uma mini peça dramática em dois atos), embora diversificados na estrutura e na temática, bem como no perfil dos seus autores, nos dão uma hipotética evolução do país sem república e, por conseguinte, no regime de monarquia constitucional.

Nesse reino de ficção, as coisas evoluíram no mesmo contexto internacional: surgiram as duas guerras mundiais, instalou-se o comunismo, fez-se a experiência do nazismo e do fascismo e os espanhóis tiveram o franquismo e nós o salazarismo. Salazar, revestido dos predicados de polaridade negativa com que habitualmente o caraterizam os democratas, aparece, numa hipótese, como primeiro-ministro nomeado pelo rei Dom Manuel II e, noutra, como governante empossado por Franco na sequência da fuga do rei para o Brasil, que agora se tornou reino de acolhimento.

Como já demos a entender, aparecem os putativos reis ora como soberanos altamente competentes - na linha da tradição monárquica, mas em diálogo com a modernidade, com as instituições a funcionar em perfeita saúde democrática - ora na mais deslavada incompetência, mais aplicados ao desporto e colocando todo o poder no primeiro-ministro, a raiar a ditadura e com as instituições a definhar. Temos a hipótese da administração pública forte e amiga do ambiente e do cidadão ou a função pública perdida nas futilidades, um mundo empresarial decente e com sucesso económico e preocupação social ora um mundo empresarial eivado do espírito do lucro custe o que custar com a violência social a estoirar...

As rainhas e damas tanto apaparicam a figura do rei como o criticam causticamente; e não poupam Salazar, Carmona e outros. Respigo uma ficcionada afirmação de Dona Amélia em França, a páginas 111-112: "Nossa Senhora escolheu o país mais atrasado da Europa para aparecer, apareceu a três pastorinhos analfabetos e a primeira coisa que disse... estive a ler nas confissões da Irmã Lúcia... foi que aprendessem a ler. que fossem à escola. Foi um sinal de Deus, creio-o. Mas veio o Salazar e manteve o país analfabeto.".

Enfim, é uma linha ideológica visível noutros países, em que a distinção do sucesso político, económico e social não se liga à monarquia ou à república, mas à democracia e à mundivisão. 

As políticas atinentes aos costumes seriam idênticas às vigentes hoje.

Parece outrossim constituir uma velada crítica à confissão constitucional do republicanismo. Terão razão?