Justiça ao alcance dos municípios

07-12-2013 18:57

 

Vi, no público de hoje (2013.12.07), a entrevista de Ilina Fraga, a recém-eleita bastonária da Ordem dos Advogados, cuja leitura acho deveras pertinente.

De penada em penada, toca quase todas as questões que hoje se levantam no campo da administração da justiça, de que respigo, meramente a título de exemplo: a excessiva confiança na arbitragem como solução; a assimetria na possibilidade do acesso dos mais ricos à justiça e o arredamento progressivo dos mais desfavorecidos com o encerramento dos tribunais em muitos lugares e a ausência de especialização onde o número de processos a não justifique; a não proporcionada crença na eficácia da reforma dos códigos de processo civil e penal; a carga propagandística do Ministério da Justiça; a duplicidade do deputado/advogado, que ora colabora na produção da lei ora atende o cliente conhecendo os buraquinhos de fuga à mesma.

Não gostei, no entanto, da afirmação da senhora Dra. eleita bastonária quando refere que, se soubesse que o governo iria prosseguir a reforma judicial, não teria votado no PSD. É que isso só pode explicar-se com a não leitura do programa eleitoral do referido partido ou o desconhecimento do líder e da conjuntura – coisas que não ficam bem à doutora de leis e de factos. Também achei esquisita a evolução política da sra. Dra. bastonária recém-eleita: a família era muito conservadora, mas a ilustre transmontana progrediu e inscreveu-se no PSD. Ora não creio que se tenha transformado num perigoso espécime esquerdista ou estrénuo corifeu revolucionário, nem Passos Coelho o acreditará.

Mas aquilo que eu quero destacar, porque me agrada, é a seguinte afirmação: “qualquer concelho com dignidade para o ser tem direito a este símbolo da soberania nacional”. Estava a referir-se ao tribunal. Quem me ouviu falar destas matérias no milénio passado recordar-se-á de que eu costumava afirmar que um município, para o ser em pleno, deveria ser capaz de ministrar todo o serviço de educação e ensino não superior, ministrar os cuidados primários de saúde a todos os seus munícipes e visitantes e de administrar a justiça, não obstante pudesse perder algumas das outras competências. Era assim que eu entendia que a comarca devia coincidir com o concelho e, como solução, eu não supunha a extinção de municípios, mas a criação de tribunal em todos (não o julgado de paz).

Finalmente, apraz-me ler que “a ordem não só nunca manifestou disponibilidade para aceitar encerramentos como no passado chegou a propor ao ministro Alberto Costa a criação de novos tribunais, uma vez que há cerca de 70 municípios que os não têm. Não se compreende como é que o Ministério da Justiça gasta centenas de milhares ou milhões de euros em meios alternativos de resolução de litígios e não faz qualquer investimento nos tribunais.”. Globalmente gostei.